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TRANSFORMAÇÃO DIGITAL NÃO É MODISMO


por Fabiano Birchal




INTRODUÇÃO


O tema Transformação Digital tornou-se muito popular nos últimos anos, mobilizando as organizações empresariais a repensar suas crenças, valores e comportamentos, seus modelos de negócio e estratégias, seus produtos e serviços, práticas de gestão e produção, além do relacionamento que cultivam com a sociedade e o meio ambiente.


Vivemos em uma era líquida, dinâmica e absolutamente conectada: movimentos locais e globais constantemente influenciam nossa identidade, moralidade e condutas pessoais. Nossas narrativas de vida, repletas de crenças e valores, mitos e ritos, tabus e visões de mundo, são tramas cada vez mais maleáveis e intercambiáveis, posto que vamos nos fazendo diferentes, de forma acelerada, a cada dia.


Este “estar e ser” mutáveis dos indivíduos impõem uma série de desafios às organizações contemporâneas:


  • o desenvolvimento de uma nova concepção estratégica e de novos modelos de negócio, com foco real em inovação;

  • a reinvenção da cultura organizacional e a gestão da mudança;

  • o redesenho de processos de gestão e produção;

  • alterações fundamentais nas relações com clientes, fornecedores, concorrentes, sociedade, governo e meio ambiente;

  • a criação de produtos, serviços e soluções inovadoras, centradas nos clientes, e fortemente conectadas às suas necessidades, dores, desejos, hábitos e demais demandas;

  • a utilização lúcida de tecnologias digitais para melhor compreender e interagir com o que há dentro e fora da empresa, impactando positivamente toda a cadeia de valor sobre a qual a organização está baseada e com a qual está conectada.



REVOLUÇÃO DIGITAL



É importante ter em mente: a revolução digital não é um fenômeno novo - e nem as transformações dela decorrentes. É possível identificar ao menos três ondas desta revolução:


  • A primeira onda, ocorrida entre os anos 1970 e 80, apresentou ao mundo os circuitos integrados, com elevada capacidade de processamento de dados e cálculos. Tal revolução possibilitou o acesso de diversas empresas a computadores pessoais, que davam suporte precioso à programação da produção e gestão de estoques nas indústrias; ao projeto e design de novos produtos; a cálculos avançados nas empresas de energia e sistemas bancários; à indústria do entretenimento, passando pela televisão e cinema, dentre outros. Percebe-se, pois, que contribuições preciosas à economia, sociedade e cultura foram providas pelas tecnologias digitais, pela primeira vez.


  • A segunda onda, ocorrida entre os anos 1990 e 2000, apresentou ao mundo o poder das conexões digitais: computadores foram integrados e a internet se tornou a matriz de uma nova revolução, fundando novos mercados, produtos e serviços, influenciando e moldando uma nova globalização; encurtando distâncias, eliminando fronteiras, integrando economias, sociedades e ampliando horizontes; enfim, instaurando um novo contrato social.


  • A terceira onda, que atualmente estamos a vivenciar, teve início nos anos 2010 e acelerou as mudanças: dispositivos móveis e seus sensores passaram a conectar não apenas pessoas e mercados, mas coisas entre si; o gigantesco volume de dados criados, acessados e compartilhados passou a ser plenamente administrável e útil a empresas e profissionais, por meio de ferramentas de Data Analytics e Business Intelligence; com suporte das tecnologias de Inteligência Artificial e Machine Learning, tornou-se possível a identificação de padrões e tendências antes não visíveis a olhos humanos, mas não menos reais e relevantes; o universo digital se fez onipresente, e os deuses da tecnologia já reclamam sua onisciência e onipotência, revelando um mundo cada vez mais híbrido - entre o físico e o virtual.



O QUE É TRANSFORMAÇÃO DIGITAL



As revoluções digitais são impulsionadas pelas tecnologias de hardware e software, mas não se limitam a elas.


Seus propósitos, fluxos e resultados moldam identidades pessoais e organizacionais, influenciam culturas, nações e economias - alteram nossa concepção de vida e nos mobilizam a edificar e cultivar valores e personalidades inéditos. A digitalização e a desmaterialização de coisas e relações tornou-se a marca distintiva dos tempos atuais, transmutando nossas vidas em jornadas líquidas, voláteis, ambíguas, incertas, imprevisíveis, complexas e altamente mutáveis.



Neste particular, é necessário destacar que a presente Transformação Digital das organizações vai além da aquisição e desenvolvimento de novas tecnologias, apresentando-se como o processo de reconfiguração das empresas frente à natureza dinâmica e às mudanças exponenciais da Sociedade, Clientes, Competição, Economia e Tecnologias.


Trata-se, pois, de um processo de mudança organizacional potencializado pelo uso e impactos das tecnologias digitais, e que está conectado às diversas dimensões de um negócio:


  • Estratégias

  • Cultura Organizacional

  • Modelo de Negócio

  • Produtos, Serviços e Soluções

  • Processos

    • Principais (Core)

    • Secundários ou de Suporte

  • Tecnologias para gestão, desenvolvimento e produção (hardware; software)

  • Interações com parceiros, fornecedores, clientes e demais stakeholders


As organizações têm percebido a necessidade urgente de modificarem suas bases de gestão e produção, de entrar em sintonia com as transformações dinâmicas pelas quais o mundo passou e tem passado. Trata-se de uma transformação abrangente, que toca em aspectos fundamentais de uma organização, impactando em sua forma de ser, pensar e fazer no mundo.





FAZENDO A TRANSFORMAÇÃO DIGITAL ACONTECER



Diversas são as estratégias a serem adotadas, e ações a serem empreendidas pelas organizações, no sentido de iniciar e realizar, continuamente, a sua Transformação Digital.


1.Intencionalidade Estratégica


Face a tantos desafios, o processo da Transformação Digital deve começar com uma intencionalidade estratégica, legitimada e patrocinada pela Alta Gestão, e ser vinculado às diretrizes macro da organização: sua missão e visão, seus valores e políticas, seus objetivos e metas, programas, projetos e indicadores de desempenho.


2. Roadmap Digital


A Transformação Digital requer Metodologia: um framework de trabalho adequado à realidade de cada empresa, uma vez que não há um passo-a-passo genérico, que pode ser aplicado com sucesso em qualquer organização.


A Transformação Digital requer uma leitura precisa do cenário de negócios da empresa, para que se saiba onde se está, onde se quer e se precisa chegar, e qual o caminho para se fazer isso, estabelecendo prioridades e um roteiro claro. Recomenda-se:


  • Diagnóstico de Maturidade Digital;

  • Análise do Engajamento das Lideranças;

  • Mapeamento da Cultura Organizacional;

  • Análise do Cenário de Negócios (ambientes interno e externo);

  • Benchmarking;

  • Design e Priorização de Iniciativas Habilitadoras da Transformação Digital;

  • Desenvolvimento do Roadmap de Transformação Digital.


Mais além, há de se ter excelência na execução: traduzir as intenções e estratégias em ações práticas requer conhecimento técnico, compromisso e engajamento, adaptabilidade e resiliência.


3. Disponibilização de Recursos


A Transformação Digital impacta de modo profundo a estrutura interna de uma empresa, e também a sua relação com stakeholders externos - incluindo parceiros e toda a cadeia de fornecimento. Configura-se como uma mudança profunda e, neste sentido, precisa de recursos adequados para se processar. Assim sendo, destaca-se a necessidade de alocação de orçamento e outros recursos não-financeiros para:


  • Qualificação constante de Pessoas;

  • Estruturação de Projetos e Times especiais;

  • Investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento;

  • Experimentação, Testes e Aprendizados;

  • Aquisição de Novas Tecnologias;

  • Desenvolvimento de Programas de Intraempreendedorismo e Inovação Aberta, dentre outros.



4. Investimento em Tecnologias


O escopo da Transformação Digital contempla muito mais do que a aquisição e desenvolvimento de tecnologias digitais, para fins diversos. Todavia, é indispensável a qualquer organização a compreensão e utilização, de acordo com suas particularidades (evitando modismos sem sentido), de tecnologias habilitadoras da Transformação Digital.


Conforme estudos realizados pelo Boston Consulting Group, em parceria com a University of Virginia, pode-se destacar as seguintes tecnologias como emergentes (e relevantes) à Transformação Digital das organizações - e da sociedade:


  • Inteligência Artificial (Machine Learning + Deep Learning)

  • Cloud Computing

  • Cybersecurity

  • Big Data / Data Science / Data Analytics

  • Internet of Things

  • Blockchain

  • 3D Printing / Manufatura Aditiva


5. Ressignificação do Portfólio de Soluções


A Transformação Digital evidencia a relevância do foco no cliente, da construção de relacionamentos significativos em todas as etapas da jornada de consumo, e a relevância da experiência para a promoção do sucesso do consumidor.


Abordagens Customer Centric como o Design Thinking (para produtos / serviços), aliadas ao ciclo Lean (construir, testar/medir, aprender), possibilitam iterações rápidas e eficientes com os clientes, e maior sucesso nas soluções ofertadas ao mercado.


Estratégias orientadas por dados (com suporte de Data Analytics e Business Intelligence) permitem que as organizações compreendam mais precisamente os comportamentos e tendências de consumo; ferramentas digitais possibilitam melhor interação, construção de relacionamentos e incremento das vendas por meio de canais digitais de comunicação, vendas e distribuição. A digitalização do portfólio de soluções abre caminhos para a ubiquidade digital ao longo de toda a jornada do cliente.



6. Relação madura com o Tempo


Transformação Digital não é uma ação pontual e rápida, um modismo que se compra e se anuncia, para ganhar visibilidade; a real Transformação de uma empresa requer tempo, requer amadurecimento de pessoas, relacionamentos, processos, produtos e muito mais.


A alta gestão deve ter em mente que mudanças profundas não ocorrem da noite para o dia, sobretudo aquelas que envolvem mudança de crenças e valores, de comportamentos, de hábitos e costumes - enfim, de Cultura.


Isso não significa, porém, que os benefícios e resultados da Transformação Digital somente serão percebidos em longo prazo. Resgatando um dos princípios do Manifesto Ágil, destaca-se a relevância de se proporcionar um fluxo contínuo de entregas, que proporciona “pequenas vitórias” em curto prazo, que possibilitam - às pessoas, times e empresa - a confiança, agilidade e dirigibilidade adequadas para ajustes e correções de rota ao longo do caminho.


Assim, mesmo que a Transformação mais ampla seja algo a ocorrer em médio e longo prazos, pode-se obter e perceber mudanças contínuas ao longo do caminho, e colher seus resultados e aprendizados. Uma relação madura com o tempo, pois, é indispensável à Transformação Digital.




7. Agilidade Organizacional


Uma organização ágil é aquela que responde rapidamente às pressões e tensões internas e externas, adaptando-se de maneira ativa e eficaz às demandas, por meio de processos e decisões enxutos, rápidos e precisos, que continuamente geram aprendizagem e desenvolvimento organizacional.


Desenvolver continuamente a agilidade organizacional é indispensável às empresas que desejam realizar a sua Transformação Digital. De forma geral, as organizações ágeis reúnem as seguintes características, a saber:

  • Ampla capacidade de Flexibilidade e Adaptação

  • Velocidade no Aprendizado e na Tomada de Decisão

  • Velocidade na Entrega de Soluções, com foco na real geração de Valor para os Clientes

  • Processos Ágeis + Métodos Ágeis

  • Autonomia + Colaboração + Ambidestria Organizacional



8. Transformação Cultural


O maior desafio da Transformação Digital é de natureza cultural: mudança de crenças e paradigmas, de normas, regras e tabus, de comportamentos. Neste sentido, cabe às Lideranças organizacionais se lançarem a um processo legítimo de mudança, caminhando em direção ao compartilhamento de poder, ao estabelecimento de uma cultura colaborativa, de confiança, autonomia e responsabilidade.


Diante do cenário pós-digital em que vivemos, é necessário às organizações um real movimento de desapego dos fundamentos de uma gestão que está deslocada do mundo: a tradicional gestão focada no comando e controle, na estrutura organizacional piramidal, pouco flexível e repleta de castas, silos e desconfiança; a tradicional gestão de apenas valorizar as semelhanças e perpetuar o que é homogêneo; a tradicional gestão das decisões subjetivas e arbitrárias; a tradicional gestão dos ativos tangíveis e próprios; a tradicional gestão da intolerância à experimentação e aversão ao erro; a tradicional gestão do incentivo à competição interna.


Em contrapartida, torna-se urgente às organizações caminhar em direção à cultura do compartilhamento do poder, da estrutura horizontal e flexível; à cultura da confiança e da liberdade; à cultura da diversidade de visões e manifestações de valores, crenças e sentimentos; à cultura do propósito transformador; à cultura das análises e decisões baseadas em dados; à cultura dos modelos de negócios de plataforma; à cultura do incentivo à experimentação rápida, do suporte a erros honestos e da celebração do aprendizado; à cultura da inovação como hábito; à cultura da colaboração e da coopetição.



Transformação Digital não é modismo:


trata-se de um movimento urgente e profundo a ser empreendido no momento presente, em plena sintonia e conexão com o mundo em que vivemos!






 

Sobre o autor:



Mestre em Administração (UFLA) e Especialista em Gestão de Pessoas (FDC). Atua nas áreas de Inovação e Transformação Digital, Desenvolvimento de Pessoas e Empreendedorismo. Fundador e Líder Executivo na iconee; Ampla experiência como Gestor e Consultor de empresas, tendo desenvolvido e executado projetos em setores diversos, a saber: Tecnologia da Informação; Automotivo; Saúde; Consultoria; Aceleração de Startups; Educação, dentre outros.


Professor de Pós-Graduação na FDC/Skema, Grupo ANIMA, PUC Minas, Carta Consulta e IGTI; Especialista em Empreendedorismo e Inovação; Mentor em Programas de Startups; Certificado no método LEGO® Serious Play; Certificações pelo MIT; San Diego University; Michigan University; Babson College; Boston Consulting Group; Kaos Pilot.




 

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